Colômbia dá exemplo na América Latina proibindo os testes de produtos cosméticos em animais. Medida visa impedir o sofrimento dos bichos explorados como cobaia e permitir que empresas colombianas entrem na União Europeia, fatia do mercado global que não aceita que tais produtos sejam testados em animais.
O Congresso da Colômbia aprovou um projeto de lei que proíbe testes de produtos cosméticos em animais. O Senado aprovou a medida nesta quinta-feira (11) por unanimidade, no quarto debate. O projeto aguarda sanção do presidente Iván Duque, que não deve apresentar resistência, segundo veículos de imprensa locais.
Um dos coautores do projeto foi o senador da Mudança Radical, Richar Aguilar, que afirmou, segundo o jornal El País, que "somos o primeiro país da região que proíbe a experimentação para fins cosméticos em animais e esse projeto surge em um projeto crucial para a humanidade, no qual o planeta está nos dando a possibilidade de mudar e respeitar qualquer tipo de vida".
Ele disse considerar que, em média, cerca de 12 milhões de animais são usados para testes químicos. "Ao entrar em vigor, a lei proíbe na Colômbia a experimentação, fabricação, importação, exportação e comercialização de qualquer produto proibido que tenha sido testado em animais", acrescentou.
O representante da Câmara Juan Carlos Losada, também autor do projeto, destacou que "é um projeto que contribui para a vida e defende os direitos dos animais. Na definição do projeto estão incluídos todos os animais, os domésticos, os selvagens, os animais em perigo de extinção, todos eles ".
A medida estabelece que aqueles que violam a lei podem ser severamente punidos com multas que variam de 133 a 50 mil salários mínimos. A proibição não se aplica a pesquisas médicas ou testes de drogas.
Governo e laboratórios terão de providenciar métodos alternativos para garantir a segurança dos produtos, baseados nos avanços científicos e tecnológicos já disponíveis.
“O principal objetivo do projeto é impedir o sofrimento dos animais na indústria de cosméticos e permitir que empresas colombianas entrem no mercado europeu, uma região que há anos rejeita esses testes”, disse Losada em comunicado oficial.
A crueldade dos testes de cosméticos
A terrível história dos testes Draize: procedimentos usados para saber se uma substância é tóxica
Muitas agressões desnecessárias já foram feitas ao longo dos milênios em nome da beleza – as roupas de pele, por exemplo, que só caíram de moda nas últimas décadas, levaram muitos animais à morte. Mas nada parece tão atroz quanto o que a indústria dos cosméticos promoveu durante tantos anos. Por trás dessa imposição de sofrimento, estavam os testes Draize. Eles foram criados em 1944 pelos toxicologistas John H. Draize e Jacob M. Spines, do FDA (agência americana de fármacos e alimentos) para medir toxicidade aguda de substâncias – de início, principalmente cosméticos.
Os testes eram realizados em coelhos. Mas nada moderado, como injetar alguma coisa em bichos anestesiados. Nada disso. Os animais eram mantidos conscientes e presos a uma estrutura que impedia qualquer movimento e deixava apenas a cabeça de fora. Então a substância a ser testada – podia ser uma xampu, maquiagem ou até tinta – era colocada num dos olhos do coelho.
O método usual era puxar a pálpebra inferior e colocar a substância ali, como se fosse um copinho, e então fechar o olho. Em alguns casos essa aplicação acontecia diversas vezes, e os coelhos eram monitorados diariamente para que se verificasse o nível de irritação nos olhos – que podia ir de inchaço a sangramento. Veja uma descrição fria e calculista presente num dos relatórios de pesquisa de uma grande companhia química: “Total perda da visão por ferimentos internos sérios na córnea ou na estrutura interna. O animal mantém o olho fechado com urgência”. O texto também inclui informações de como lidar com o coelho ao tirá-lo do suporte. “Pode grasnar, arranhar o olho, saltar e tentar escapar.” Outra modalidade de teste envolvia a exposição da pele do coelho – que precisava naturalmente ser raspada antes – às substâncias testadas, com os mesmos efeitos deletérios. A pele pode sangrar, formar bolhas e descascar.
Os resultados não eram perfeitos, mas bastante razoáveis para estimar a segurança. Em 1971, cientistas da Universidade Carnegie Mellon avaliaram o quanto o uso dos testes Draize acertavam ou erravam na avaliação de substâncias. Descobriram que a chance de uma substância potencialmente perigosa passar no teste como segura era praticamente nula – no máximo, 0,01%. Já a chance de um irritante suave passar como seguro era maior: 3,7% a 5,5%. Por fim, a chance de um irritante perigoso ser originalmente classificado como um suave era significativa: 10,3% a 38,7%. Isso reflete as diferenças entre um coelho e um humano – nem sempre o que observamos nos olhos e na pele de um é o que acontecerá nos do outro. Mas a grande questão mesmo é: não havia testes alternativos, ou mesmo protocolos alternativos, que pudessem diminuir o número de animais utilizados e o grau de sofrimento a que eram submetidos? E outra: produtos cosméticos são o tipo de produto que justifica o uso indiscriminado de outros seres vivos?
Até a década de 1970, ninguém questionava muito isso – a noção de que os animais deviam ser vistos como autômatos, à la Descartes, ainda estava bem disseminada. Mas aí livros como o de Peter Singer começaram a levantar essa lebre. E os animais, não têm direitos? Não deveríamos proteger seu bem-estar ou, pelo menos, não puni-los com nossos empreendimentos fúteis? Em 1980, um movimento nos Estados Unidos sugeriu que a companhia Revlon, maior fabricante americana de cosméticos, investisse 0,1% de seu lucro em pesquisa de alternativas ao teste Draize.
Quando a empresa recusou a sugestão, o grupo publicou um anúncio de página inteira no New York Times com letras garrafais: “Quantos coelhos a Revlon cega em nome da beleza?” Pressionada, a empresa resolveu alocar os recursos. E outras companhias de cosméticos, como Avon e Bristol-Myers, seguiram o exemplo. Ao final da década de 1980, os resultados já eram palpáveis. Em 1989, a Avon anunciou que havia desenvolvido um material sintético chamado Eytex que podia servir de substituto para o teste Draize. Em junho daquele ano, a empresa divulgou que não usaria mais animais no desenvolvimento de seus produtos. Oito dias depois, a Revlon fez o mesmo anúncio. A batalha pelo fim da crueldade animal no ramo dos cosméticos estava praticamente ganha.
E o movimento, evidentemente, também trouxe benefícios claros para animais usados em outros tipos de pesquisa em toxicologia, que passaram a usar com maior frequência cultura de células em laboratório, materiais sintéticos e simulações de computador. Trata-se de um exemplo de como se pode, com engenhosidade e aplicação, reduzir bastante o tanto de sofrimento que impomos egoisticamente a outras criaturas.
Testes de produtos cosméticos no Brasil
No Brasil ainda não existe, em âmbito federal, uma legislação que proíba esta nefasta exploração animal. Há, no entanto, um o Projeto de Lei (PL 948/2019) de autoria do deputado federal Célio Studart (PV-CE), recentemente apensado ao PL 6325/2009, que defende a proibição, em todo o país, do uso de animais em testes de produtos cosméticos, de higiene pessoal, perfume e limpeza. Alguns estados brasileiros como Paraná, São Paulo e Minas Gerais já avançaram com sua legislação estadual proibindo estes experimentos cruéis.
É uma tendência mundial a expansão da proibição dos testes em animais pelas indústrias de cosméticos, tendo em vista que tais práticas não se justificam racionalmente.
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Com informações do UOL